terça-feira, 25 de agosto de 2009

Poemas publicados no livro
"QUARENTA SONETOS SEM PECADOS"
Editora Zem - Teresópolis - Rio de Janeiro - 2007:

UM DIA...

Do teu corpo, percorro a geografia;
como o vento, te envolvo por inteiro.
As carícias e o beijo verdadeiro
renderão homenagem à fantasia.

Na trilha da volúpia incandescida,
atiro-me em sentido alentador,
do êxtase fazendo-me senhor,
ante a aventura da alma ensandecida!

Sou livre, e a liberdade conhecemos!
Por isso, não importam tais momentos...
Mas nunca esquecerei teus ais profanos!

Desejarás, um dia, o que vivemos:
realidade fugaz dos sentimentos,
cheios de paz, de gozo e amor insano!
#
COMENTÁRIOS:

“Obrigada pelo lindo poema...Abraço e fica com Deus!!!”

Jackie Nascimento - RJ

rjjackie@gmail.com

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“Obrigada...suas poesias são inspiradoras”.

Sâmara Fagury – Campinas – SP

samarafagury@zipmail.com.br

#

“Olá! Quero te agradecer pelos lindos poemas e te desejar um excelente 2007. Que você fique muito mais inspirado para continuar escrevendo textos tão bonitos”.

Fernanda Maia – SP

satine.23@bol.com.br

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“Oi, Antonio, obrigada pelos poemas. São lindos! Continue enviando. Feliz 2007, ou melhor, felizes anos novos. Beijos”.
Eliane Reis – Novo Horizonte –SP

li_poesia@hotmail.com

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“Antonio,
Obrigado pelas belas poesias.
São muito bonitas mesmo.
Você é muito bom!”

Salvador – Bahia




INSPIRAÇÃO

Mas eis que a inspiração que se ausentara
agora se aprochega à noite fria,
confortando minha alma tão vazia,
nutrindo o sentimento que não sara.

Recebo-a na cadência dos encantos,
tecendo as ilusões do amor ansiado.
Do meu desejo, emerge augusto fado;
do verso, brotam luzes, brotam cantos.

A inspiração colheu-me, desta feita,
centuplicando temas esquecidos
num passado de sonhos fenecidos!

No tremor da emoção que me sujeita,
escrevo este poema à musa eleita,
mas só, sob amargor imerecido!

SINFÔNICA DA FOME

Na procissão desesperada dos aflitos,
escorraçados pelo açoite das promessas,
segue a lamúria, segue a dor e segue o pranto,
na reza atônita que abisma as emoções.

Quais trapos vivos que outros trapos repudiam,
olhos profundos pela insônia repetida,
vão-se no atroz revezamento da vigília,
buscando ao longe a luz de novas esperanças.

Nessa ginástica de olímpica cruzada,
aproximando-se aos funéreos vendavais,
caminha o séqüito faminto e pessimista.

Na sorumbática e espantosa osteografia,
vai-se o epidérmico chocalho de ossos vivos,
na monolítica sinfônica da fome!

PROVAÇÃO

Instala-se um silêncio de mistério
no coração tomado de aflições.
As multifacetadas emoções
encontraram repouso em monastério.

Antes assim: razão, tino e torpor
sirvam de manto augusto ao meu critério,
revelando ao desejo a luz do império
de uma força maior que o próprio amor.

Se no amanhã da espera tão renhida
eu colha os louros desta intensa lida,
festejarei as dádivas com vinho!

Mas, se em lugar do prêmio e da guarida,
eu receber as dores sobre o ninho,
aceitarei sofrer sob os espinhos!

ANTES QUE SEJA TARDE

Não quero sucumbir com minhas ânsias,
andrajo dos sentidos, forasteiro
à espera de um amanhã que nunca chega,
mergulhado em quimeras e esperanças!

Levem-me daqui, já! Levem-me logo,
enquanto ainda não sinta a escuridade
das noites frias, noites de relento,
destruindo a carne nua ao desabrigo!

Há limo nos escombros da minha alma.
Vê-se, pois, como antigo é o sofrimento
que devassa de ponto a ponto o ser!

Desejo, pois, o rito da passagem,
antes que assista a fúnebre empreitada,
aniquilando os últimos dos sonhos!

DEGREDO

Embriagar-me-ei com teus anseios, teus segredos,
serei amor intenso, ardor e tudo o mais,
durante o tempo de vigência do degredo
que, com certeza, na tua alma abrigarás!

Quando ao meu lado, na lascívia e no aconchego,
tu sentirás calor, amor... sentidos tais,
que um pensamento, então, se faz segredo:
“Esse degredo para sempre manterás!”

E a descobrir-te por inteiro muito cedo,
à luta intensa me darei pra que jamais
tu me liberes dos teus sonhos, teus enredos!

A desvendar-te ponto a ponto tu verás
que todo o tempo foi de encanto raro e ledo,
e a todo custo, prolongá-lo tentarás!

O PRAZER

Venero a natureza do prazer,
um milagre genético da vida
que ao ser humano entrega florescida
a árvore do encanto e do querer.

No dia-a-dia, vence a doce lida,
no processo da ardência a recrescer.
É ilusão, sonho, gozo a languescer,
ao rito hereditário da ultravida.

De repente, ressumbram sensações
a percorrer os nervos espinhais,
aos auspícios dos nervos encefálicos!

Repertório sagrado de emoções,
é o prazer que eterniza os imortais
em simples ais, em simples tons vocálicos!
APÓS, O OLOR QUE ALENTA

Os corpos transpiram no leito de sonhos,
entregam-se à sorte do amor sem limites,
trocando murmúrios, carinhos, palpites,
trazendo nas faces dois jovens risonhos!

As mãos tremulejam em mútuo convite,
ao tácito verbo dos seres pidonhos,
ao canto lascivo jamais enfadonho,
nascido no império da deusa Afrodite.

O tempo aprimora o instintivo pulsar
dos dois corações manietados às ânsias,
rendidos à viagem sublime das almas!

E mais uma vez, na explosão do arquejar,
espalha-se aos ventos a doce fragrância
do olor misterioso que alenta, que acalma!

AMOR AUSENTE

A emoção da lembrança pouco importa:
é resto, é cinza, tempos remexidos,
tantas vezes roteiro não vivido,
que nos ilude, amarga e não conforta!

Norte desencontrado, onde o sentido
revela-se exaurido e coisa morta,
aturdindo a memória e abrindo a porta
de fatos que se quer ver esquecidos!

Rumo incerto, aventura indefinida,
sonhos vagos aos pés do peregrino,
perdendo as horas caras do presente!

É sorte espúria a espera empedernida,
ilusão de veneno diamantino
de quem não mais terá o amor ausente!

O RITO DOS ZANGÕES

O verbo dos teus lábios sedutores
arruma-se nos versos do rodeio,
proclamando o vigor do devaneio
que alumbra o coração dos teus amores.

Teu verbo explode virgem do teu seio,
rendendo aplauso aos teus aduladores,
evitando magoar tantos senhores
que aspiram teus carinhos, teus enleios.

Teu verbo é a primavera da libido,
espargindo os olores das florinhas,
sob o clamor das chamas do desejo!

O rito dos zangões é obedecido;
nesse processo, tu és uma rainha:
eu morro e gozarás os teus voejos!


VIBRAÇÕES

No repente da noite silenciosa,
ao ferrete do amargo das esperas,
eis que lhe chega, linda e maliciosa,
quem não viria, mas chegou deveras.

A força transcendente da libido
aborda o instinto puro do animal.
Desperta, então, o amante sucumbido,
reassumindo energia doutro astral.

Olhos nos olhos, bocas se aproximam,
sob a preliminar concupiscente
que arrosta a nervatura às impulsões!

Agora, vibram corpos que se animam,
naquele quarto há pouco tão silente,
ao rigor das mais veras emoções!

SENTENÇA DO AMOR TRAÍDO

Escombros memoriais guardam desgraças
da história de um amor infortunado,
nascido em coração já maltratado
pelos desprezos tantos e chalaças!

Amor ardente, puro, adulçorado,
rendendo inspirações sob alta graça,
eis que num de repente se esfumaça;
com ele, o lar de paz, lar sublimado!

Homem experiente, foi-se, então, com calma
dar descanso à idade em monastério.
Mas, antes, sentenciou à ninfa ingrata:

“- Apunhalaste, ao fim, por trás, minha alma,
gozando de momentos refrigérios,
sob traição que ainda me maltrata!”

A FONTE DO DESEJO

O desejo abre as portas, rompedor!
Nascente de energia inexplicável,
seu segredo de ação é impenetrável,
mas tenho uma certeza: vem do amor!

Por que maior que tudo, invariável,
não há outro sentido, outro fervor,
que se arvore em potência e em tal ardor
como este sentimento insaciável!

Coração descompassa, alma se agita;
complicam-se as idéias e os projetos;
as cores e o horizonte se transfundem.

O amor é inspirador e não cogita
o desprezo das ânsias, dos afetos,
enfim, dos sentimentos que o aludem!

PRISIONEIRO

De antemão, sabedor do tempo ingrato,
enclausurado e só -, masmorra antiga -,
sinto vingar apenas a cantiga
do látego no corpo intemerato.

Sabedor que a agonia é o meu retrato,
sob aplausos das dores da fadiga,
sinto nojo dos pulhas de uma figa
que apontam meu sofrer algo abstrato!

Ao deus-dará, soçobram pensamentos,
ao rés-do-chão levados pelos ventos,
tal se a memória fosse imenso zero!

Aquele aceno foi justiçamento
de acusação de eventos insinceros,
sobre o amor que carrego ainda austero.

PROCESSO DE PRAZER E CRIAÇÃO

Na relva, a caça busca os caçadores,
há cio em primitivas ansiedades;
torvelinho no chão de asperidades,
vulcânico espargir dos seus calores!

Instintos em fusão com a tempestade,
são forças, são embates redentores,
gerando fogo, brasas e vapores.
Ressuma o gozo, assim, da eternidade!

Seres humanos, seres do mistério,
prostrados nas alfombras da magia,
entregam-se à grandeza da criação!

De milagre em milagre, ao climatério,
lençóis em desalinho, o tempo envia
a nova juventude à sucessão!
AUSÊNCIA

Converso comigo, contigo, com as horas,
chutando os abrolhos à flor das areias
que um dia nos viram felizes, sem peias,
ao canto de enlevo das ondas sonoras.

Aos ventos alísios, a mente campeia,
sofrendo tua ausência que minha alma deplora,
sentindo saudades, querendo-te agora,
sofrendo a friagem do sangue na veia!

A tarde desenha horizonte obumbroso;
já não mais palpitam desejos ardentes;
de novo me entrego à tragédia fatal!

Os olhos perdidos no mar tenebroso,
no escuro das águas, sentidos ausentes,
relembro o naufrágio fator do meu mal!

SILÊNCIO ANSIOSO

Quero sentir teu corpo e a tua essência.
Vamos, entrega a boca ao meu desejo,
no sublime voejar dos meus ensejos,
como a abelha se entrega à florescência.

Na primavera viva dos encontros,
dá-me a volúpia pura que te toma,
em forma de ais, gemidos, sem redoma,
que te farei feliz com pouco apronto.

No navegar sem rumo dos tremores,
rompa os limites cinzas do teu medo,
agarra-te com fé aos teus sentidos.

Sinta o silêncio ansioso dos ardores:
é a natureza abrindo as portas cedo
dos mistérios que trazes tumescidos!

PARA O AMOR SEM SUBSTÂNCIA

Ao rigor das saudades carrascais,
decifrando os amores já perdidos,
vestimos carapaças de iludidos
no transitar da vida tão fugaz.

Por que homenagear sonho rompido,
desejando o ser fútil, o ser sagaz,
entregar-se ao valor que não apraz,
se à frente nosso amor será atendido?

A força que supera nossa escolha,
trazendo-nos sinérgicos anseios,
nasce do caos vulcânico do instinto!

Não ceder, como cede ao vento a folha;
ser rijo, relutante e sem rodeios,
para escapar da vida de absintos!

AO FIM, SOLIDÃO
Essa tresloucada lascívia que morde
na solidão rude do quarto e da rua,
navalha, silêncio, loucura que estua,
é voz das lonjuras, primevos acordes.

A força neurônica ativa-se nua;
o corpo se entrega ao sentido que o aborde;
importa a libido, que avulte e transborde
impera o animal que o instinto insinua.
Ao chão são lançados projetos conscientes;
madura é a lascívia sem peias, sem doma,
sacudindo a febre e os tremores nevróticos!

Essa ardência é brasa, calor eficiente,
transtorno noturno da carne que assoma
desejos virados em sonhos eróticos!

OLÁ, PRAZER!
Olá, prazer, seja bem-vindo! Vem,
açambarca meu corpo de uma vez!
Será vício o que sinto e o que tu vês,
diante do corpo nu que me entretém?

Prazer adulçorado, augusta paz,
convido-te ao milagre da libido,
nesta ardência de frêmito incontido,
onde me basto no êxtase que apraz.

Esboço-te à grandeza do universo,
és o cosmo, és palavras, és o verso,
és o mestre envolvendo-me em delírios!

À luz do alvorecer, eu me despeço;
deixo a noite dionísia, vai-se o círio,
fica o corpo rendido ao olor dos lírios!

ABANDONO

Como nada a querer, eis que me entoca,
sob o fulgor de linda meretriz,
uma paixão profunda e chamariz,
algo que me entontece e que me invoca!

Passado um tempo, ouvi um diz-que-diz
rondando atrás das portas da fofoca.
E após imaginá-lo ser lorota
eclodiu como fato dos mais vis!

A história amarga foi-me como um tiro;
ela dissera ser minha senhora,
amante a qualquer tempo, até a desoras!

Agora, solitário, em vãos suspiros,
aumenta o contingente dos meus vírus,
carcomendo minha alma mundo afora!

AO ANOITECER

Tecendo lembranças de fatos e enleios,
relembro emergências do amor-acalento,
ao som repetido das ondas ao vento,
na dança dos corpos em suaves floreios.

Teu corpo, tua alma, teu hálito puro,
teu beijo seguro, teu gozo sem freios,
são marcas guardadas nos meus entremeios,
antigas memórias, com zelos e apuros.

Murmúrios tecidos em ais, choramingos,
nas praias desertas de tantos domingos...
que lanho nostálgico rasga minha alma !

Ao anoitecer, fura-buxos, flamingos,
gaivotas em festa brindavam a calma
de um espaço só nosso... e ao redor sem vivalma !

TRILHA DOS PRAZERES

Assim... deita-te agora, dá-me o colo.
No teu corpo, no campo mais sensível,
sentirás minhas mãos, alma visível,
num frêmito de amor sem protocolo!

Eis a estação primeira onde controlo
preliminares no antro do possível,
agitando o universo do invisível,
levando as emoções a tiracolo.

Junto à cintura inquieta e dadivosa,
instinto a por ao chão todo juízo,
verás que os teus grilhões se romperão.

Ver-te-ei nos cosmos, bela e venturosa;
eu e tu visitando o paraíso.
Nossas almas, assim, desmaiarão!

RECORDAÇÕES

Ferrete que trago nos vãos da memória,
recordo teus ais misturados às brisas,
vivendo o silêncio através das balizas
das noites profundas fadadas à história!

Ao êxtase puro que o apego entroniza,
no doce mistério da augusta vitória,
rompias divina em feliz trajetória
o cosmo sagrado que o amor eterniza!

Tua alma, teu cheiro, teu sexo forte,
a marca indelével da amante sem freios,
tudo isso é lembrança de antigos anseios.

Ao canto noturno do azar e da sorte,
nós dois revelamos a vida e a morte
na entrega dos corpos, sem medo ou rodeios!

É TARDE

Chegara perguntando: “- E aquele beijo
vulcânico e atrevido que me deste?”
Respondi: “- Me julgaste um cafajeste
a me adonar das moças de sobejo?”

“- Nunca mais vi, e até hoje não vejo,
rapaz tão desabrido, flor de peste,
jogando o olhar ardente sobre a veste,
rompendo o meu pudor com seu traquejo!”

“- Nosso primeiro encontro, então te lembras?
E como aquele beijo tu recordas?
E os teus olhos...teus olhos esfogueados!

Tu me queres. É tarde! Vai, relembra:
partiste e me deixaste sobre as bordas
de dor profunda e acerba! Um fracassado!”

AMORES VIRTUAIS

Estranhos, como não, nessa distância,
trocando confidências, ais e juras,
intimismo de pura rutilância,
ao zelo de elogios com ternura!

Sentidos luxuriosos, emoções,
meiguice, amor, promessas repetidas
nos sonhos madrigais, nas sensações
castigando nossa alma sacudida!

À apatia do tempo, tomo vinho,
sob o amargo sombrio da saudade
de quem sequer o rosto eu adivinho!

Sobre a mesa, papel, caneta e a herdade
composta pelos versos da verdade,
declarando a ilusão dos meus caminhos!

ENFADO

Tira o véu deste rosto misterioso,
mostra a ardência da boca esplendorosa!
És escrava das ordens imperiosas,
ditadoras do teu querer fogoso!

Pecam teus pensamentos, tuas prosas;
tu te assentas em hábitos baldosos!
Em ti, proliferam perigosos
instintos e atitudes poderosas!

Momentos deleitosos são teus sonhos;
é tudo natural, nada me oponho,
é enlevo de futuro que planteio!

No entanto, tu declaras enfadonhos
o amor que nutrifico e garganteio
à luz dos meus sinceros galanteios!

ALGOZES NOTURNOS

Há noites frias, longas, sujas, vãs, silentes,
donas de abrigos nus, de andrajos nulos de ânsias,
estes gemendo, aos breus, as dores das infâncias
e a idéia bruta, forças cruas, inconscientes!

Sono sem sonhos, ei-los sob a intolerância
da elite burra, assaz soberba e incomplacente,
que nessas noites vendo a dor de tanta gente
alcança o gozo na omissão da dominância!

De um lado, sem razão, mordazes furibundos,
cruéis no plano torpe e atroz do menosprezo:
aniquilar de vez, sem dó, os moribundos!

Mísero tempo, noutra banda é medo aceso!
Sim, quais sarnentos cães, ao rés-do-chão imundo,
basta de algozes contra pobres indefesos!

LAMÚRIA

Sou homem, és mulher, somos dois seres,
heranças do milagre mais primevo,
trazidas ao presente em doce enlevo,
sob a constância ativa dos prazeres.

Estigmatizada a carne e as ânsias
ao prazer mais antigo dos impulsos,
no amor não prevalecem discrepâncias,
vigora, sim, algum queixume avulso.

Sentimento primeiro, quase instinto,
confesso-te sem culpas que não minto,
ao reafirmar meus sonhos de luxúria.

Porém, nas noites frias, o que eu sinto
é a acerba solidão, atroz e espúria,
assoberbando minha alma de lamúria.

RECANTO DAS ROSAS

É primavera, as rosas se apresentam,
sob vário matiz e exuberantes.
Aveludadas pétalas fragrantes
transmitem paz, olores e acalentam.

Flores maduras, lindas, balouçantes,
à natureza todas acrescentam
o toque da magia em que se assentam
as obras delicadas e irradiantes!

Na festa dos sentidos, olorizam,
e aos olhos encantados colorizam
os recantos diversos do vergel.

Florações que o cenário valorizam,
enfeitam ao mesmo tempo a terra e o céu,
sob a ação do divino menestrel!

OUTRA TEMPESTADE

Nos instantes mais vivos dos desejos,
alma integrada ao cosmo dos meus sonhos,
desperto dos silêncios enfadonhos,
para ouvir da tua boca uns rumorejos.

Lá fora, o vento ronca seus bocejos,
protocola presságio assaz medonho,
enquanto junto a ti o amor imponho,
atendendo aos prazeres que antevejo.

De repente, os avisos que se amansa
o rumor tenebroso da procela,
pondo cobro às tensões mais opressoras.

Agora, impera os ares da sustança.
No quarto, a gemedeira me revela
que é de outra tempestade precursora!

LÁBIOS

Lábios carmins, pitangas atrativas,
grossos, ansiosos, úmidos, eróticos,
estimulando o instinto aos ais neuróticos,
na permuta – entreabertos - das salivas!

Regentes do festejo da lasciva,
conferem movimentos epiglóticos,
estabelecem ritos hipnóticos,
no encontrar-se da boca convulsiva!

Guardiões da língua astuta, ofídica e hábil,
servem ao tolo, ao grosso, ao vão e ao sábio,
moldados em simétricos tremores.

O lábio olvida a luz dos alfarrábios;
as línguas são agentes invasores,
entronando desejos redentores!

O AMANHÃ É MISTÉRIO

Arrebenta as correntes do teu medo,
mergulha nas torrentes da ousadia!
Tu queres vinho, eu quero teus segredos,
desvendá-los na tua anatomia!

Destroça teus fantasmas com euforia,
venera as minhas mãos, toca meus dedos!
Verás que, do teu corpo, a geografia
deles terá o império dos folguedos!

Assuma a transgressão dos teus augúrios!
Comemora a libido indisfarçável!
Entrega-te ao milagre dadivoso!

Ao encontro dos corpos, dos murmúrios,
viveremos mistério impenetrável.
E tudo será sonho, amor e gozo!
RONDA

Rondo teus olhos densos, misteriosos,
faróis perscrutadores, transcendentes,
iluminando vidas decadentes,
afastando-as de traumas nebulosos.

Rondo tua boca, sede dos conselhos,
portal das esperanças espargidas
sobre incontáveis almas sem guarida,
cujas condutas seguem teus espelhos.

Rondo teus gestos francos, teus sentidos
e o frescor matinal de rosas puras
que emerge do teu lábio enternecido.

Rondo, enfim, a lascívia mais segura
que escorre transparente da ternura
com que evocas os sonhos não vividos.

SENHORA DA EMOÇÃO

Penetro o norte augusto do teu passo,
sinto as águas profundas, misteriosas,
margeadas de florestas segredosas,
onde guardas teu ninho e teu regaço.

Na solidão da noite envolta em paz,
vejo teu rosto ao vento tropical,
a receber a essência estrutural
que brota dos processos naturais.

Teu corpo veludoso me emudece,
teus ais vibram nos veios das magias,
rendendo o assaz vigor das impulsões.

Voyeur, nesta aventura que ensandece,
sob o calor das minhas rebeldias,
és tu dona das minhas emoções!

HAVERÁ UMA SAÍDA?

Não venço o visgo, o abismo, as horas nuas,
andando alhures sem nenhum sentido.
Jornada vã, ao passo ensandecido,
na busca solitária que me amua!

Ao fim, procuro o quê, se fui banido
até da solução do último encontro?
Talvez, num desafio ou num confronto,
entre as razões, esteja eu já perdido!

Quem sabe me lancei numa procura
em torno de fantasmas, coisas mortas,
debilitado à força dos delírios?

Incisivo, porém, algo assegura
que ao término da busca alguma porta
acabará de vez com meus martírios!

NO AMOR, O MAIS-QUE-PERFEITO É VIVER

Poemas de pedra, de ferro, de aço,
tramando soluços, angústias e encargos,
nutridos na adaga, nos freios, no laço,
lavrados ao peso de esperas e embargos.

Saudades sem conta buscando o passado,
o vate se entrega ao versejo do sonho,
sabendo-se arquivo já morto e acabado
à luz dos desejos que o fazem tristonho.

Acorda, poeta, ao luzir do amanhã!
O ontem vai longe, sobejam lembranças,
fantasmas, vazios, silêncio e sofrer!

Desperta à beleza da vida mais sã,
aos versos tomados de canto e esperança,
pois, no amor, o mais-que-perfeito é viver!

MEU PORTO SEGURO

O intenso desejo desvaira e se agita
no denso silêncio do quarto e das ruas!
Navalhas e puas são minhas, são tuas,
é o pulso que avança, é o mistério que habita!

A força neurônica assume a guarita;
agora se inflama a emoção da alma nua!
Os corpos se entregam à regra mais crua,
sob a natureza segura e perita!

É a febre da ardência tomando o universo;
é o grito maduro do mais belo verso,
rendendo homenagem ao êxtase puro!

São sonhos, quimeras, enredos dispersos,
um mágico encanto que abraço e te auguro,
pois és nestas horas meu porto seguro!

DAR-TE-EI O UNIVERSO

Desejei teu sorriso, teu olhar,
teu coração, tua boca e as mãos macias.
Com vigor, me disseste que querias,
em troca disso tudo, o céu e o mar!

Lembro bem, respondi que concordava
e que tu poderias te apossar,
além daqueles bens, também do ar,
das nuvens e do tempo, eis que eu te amava!

Mas tu - que brincadeira de mau gosto!-,
pediste muito mais para ceder-me
teus atributos, causa dos meus ais!

No entanto, reconheço que o proposto
ainda é pouco e que posso oferecer-te
o universo e seus mimos eternais!

PARTIR

Para onde, não sei, mas partirás,
e os teus caminhos não serão os meus.
Estarei sob invernos procelosos;
tu irás para as blandícias do desejo!

Teu corpo e as emoções que nutrificas
penetrarão as trilhas doutras terras,
atrofiando a libido que me atiça,
transformando a lascívia em vã lembrança.

A praia repintada de sargaço,
águas revoltas, ondas, gaivotas,
já treinam a orfandade e a solidão.

Nuvens cinzentas, tristes, misteriosas,
serão as companheiras de jornada,
até que o sol desponte não sei quando!

INFINITO

Às vezes, sou meu lobo, instinto forte,
matéria de ascendência primitiva
que me traz preso à rédea restritiva,
a energizar meu pulso e minha sorte.

Não raro, sinto à volta a espúria morte,
pomposa, projetando a estimativa
da existência banal e rotativa,
no suceder das horas do meu norte.

Porém, repito, sou meu lobo às vezes,
rompendo as grades férreas das sanções,
sob os instintos de aço e de granito!
Aviso à foice não temer reveses!
Aviso à vida não temer senões!
Em breve, partirei para o infinito!

DESISTÊNCIA

O agora são coxas, são lábios, são seios,
são ternas palavras, trejeitos sensuais.
Meus olhos divisam nos traços normais
a doce miragem que acode aos anseios.

Arrumo a memória, manejo a lembrança
e ao fim me convenço que és sexo vivo,
forjada em carícias, reais lenitivos,
que assume o desejo do amor que não cansa!

No entanto, és ninfeta rendida aos hormônios,
perdida no mundo, nas mãos dos demônios,
que ao meu desejar só transluz incerteza.

Recolho o entusiasmo por tua beleza,
apago a visão que ensandece os sentidos
e afasto meu corpo dos sonhos bandidos!

VELHA PORTEIRA

Porteira antiga, agora uma passagem,
escancarada, livre e abandonada,
leva ao engodo atroz de uma miragem,
entrega ao forasteiro uma invernada!

O limo espesso, as eras e a friagem,
pátio silente, casa abandonada,
mostram que o tempo agiu com boicotagem,
transformando a memória em quase nada!

Centuplica-se, agora, a grasnadela
dos agourentos corvos milenares,
onde antes fora herdade colossal!

Sob as noites suspeitas, a cancela
range ao rigor das ondas dos lufares,
traduzindo a abrangência fantasmal!

DESTA VEZ, VEM E FICA!

Inventa uma mentira aos teus botões;
rebenta as rédeas de aço do senso ético;
manda às favas as ordens e as razões;
entrega-te aos anseios energéticos!

Luzem teus olhos dúbios nos senões;
teus movimentos tornam-se patéticos!
O que sofres são duras privações,
presságio artimanhoso, vil, profético!

Dói-me ver teu desejo adormecido,
teu corpo frio, outrora incandescido,
e um grito na garganta a sufocar-te!

Aproxima teu corpo enlanguescido,
dar-te-ei prazer até que tu te fartes.
No entanto, dessa vez, não me descartes!

ALMAS ENFADADAS

Explode êxtase intenso, nas alturas;
nada importa lá fora aos corpos nus.
O olor do ambiente é incenso que seduz
elevando a emoção à estremadura.

São segundos pujantes de euforia,
anulando a consciência mais segura.
A viagem encetada transfigura
a realidade dura em fantasia.

O corolário vivo dessa festa
constitui-se no instante do apogeu,
das sensações tão bem multiplicadas.

O retorno, porém, da heróica gesta,
a despeito de tudo o que se deu,
é uma aventura de almas enfadadas.

ENCONTROS CLANDESTINOS

Sinto saudades dos encontros clandestinos!
Dois corpos livres, leves, nus, cheios de amor,
sobre as alfombras dos capões, sem desatinos,
viagem da alma enlanguescida em puro ardor!

Ao suave olor das brisas, dádiva das flores
desabrochadas nos vergéis e na floresta,
desnuda a ninfa, seios túmidos em festa,
eu me perdia nos seus ais encantadores!

Näo me arrependo da lascívia satisfeita,
ao lado da mulher, amante e musa eleita,
nas tardes, noites e manhäs afrodisíacas.

Na agricultura dos sentidos, a colheita
será rendosa obra de luz e de afasia,
desejo augusto de silêncio e de ambrosia!

É ASSIM ÀS VEZES

As horas são chantagens, farsas nuas.
Os beijos são tramóias, precipícios.
Neste ror, as verdades dos hospícios
mancomunam-se ao viés das almas cruas.

Não prospera a esperança do reencontro,
data marcada ou fatos decididos.
Amantes, estarão sempre aturdidos
no universo abismal do desencontro!

Alhures, o horizonte sem futuro
dissolverá sentidos imaturos,
forjados numa quadra de promessas.

As ilusão dos amores extramuros
é transmudante, é sonho às avessas.
É o teatro das juras noutras peças!

TEMPO ACABADO

De súbito, aflora do peito uma dor
profunda e marcada por rara acridez.
É a luta sem trégua na busca do amor,
levando minha alma a sofrer na aridez!

Assumo os amargos, tristeza abismal,
entregue à leitura de cartas antigas.
À noite, em silêncio, relendo este mal,
empresto meu corpo à mais rude fadiga!

Se sonho acordado o retorno da musa,
trancado no quarto de sombras regado,
abraço o universo da história inconclusa!

Exausto, sucumbo, sofrendo meu fado,
lembrando desditas e mágoas intrusas,
firmando a certeza de um tempo acabado!

O AGORA É NOSTALGIA

Por mais que os meus anseios relutantes
procurem te esquecer, eu não te esqueço.
Afundo-me nas dores angustiantes,
sofrendo o que não quero e não mereço.

A luz da espera vã me ofusca o senso,
levando ao descompasso o coração.
Sobra da luta ingente que não venço
o amargo mais profundo e a frustração.

Entendo que o amanhã é outro dia;
outras serão as veias do sentir,
no processo primário do esquecer.

Ocorre que o agora é nostalgia,
desejo insatisfeito a me aturdir,
solidão sem fronteira a me render.

EXPECTATIVA

A flor do amor que colho agora é tua,
botão agreste, vaso de perfume.
Como o teu corpo belo, ele resume
a rosa rubra, meiga, doce e nua!

Ao teu desejo, empresto o meu costume
de venerar-te o porte pelas ruas,
sabedor que do orgulho não recuas,
mas ciente que és mulher sem azedume!

Prezo-te mais que tudo e não te esqueço;
vives dentro de mim como um segredo;
no teu amor, existo a transcender.

A esperar-te ansioso permaneço,
com a flor hoje colhida no degredo,
para por cobro, enfim, ao meu sofrer!

UTOPIA

És fera no cio rompendo florestas,
desejo indomado de impulso vulcânico,
entrega sem peias das zonas sensuais,
comando do instinto num moto-contínuo.

Sei bem da aventura encetada no leito,
volúpia de ninfa desperta às viagens,
congresso de arroubos levando ao desmaio,
vivência de um sonho de místicos ais!

Mas sofro a desdita sabendo-te longe,
nos braços de amantes, na entrega sem tino
dos beijos, dos seios, na flama das ânsias!

Nos redemoinhos da vida me encontro.
Saudades em penca, desfaço meus sonhos,
cedendo às angústias e à acerba utopia.

DESPERTAMENTO

No repente da noite silenciosa,
ao ferrete do amargo das esperas,
eis que lhe chega, linda e maliciosa,
quem não viria, mas chegou deveras.

A força transcendente da libido
assume o instinto puro do animal.
Ei-lo desperto, amante, enternecido,
sob a coberta do pulsar ventral.

Olhos nos olhos, bocas lado a lado,
sob a preliminar concupiscente
que arrosta a nervatura às impulsões.

Naquele quarto, há pouco tão silente,
eis corpos nus, acesos, animados
ao rigor das mais puras vibrações.

ORGULHO

Sei dos teus pecados, das tuas ardências,
das súplicas tantas que explodem na tua alma,
quando as sensações da lascívia te envolvem
e tu estás sozinha no quarto das ânsias!

Sei do desalinho da roupa de cama,
das mãos que se apertam, do ventre impaciente,
dos lábios sequiosos, dos teus seios túmidos,
das coxas deixadas ao teu travesseiro!

Tua alma incendeia, teu corpo se agita,
teu canto se faz langoroso gemido,
enquanto se esfumam as horas da noite!

Não frustres assim teus instantes lascivos!
Ativa teus sonhos e mata este orgulho
que, alfim, nos maltrata em atroz solidão!

REIVINDICAÇÃO

Transmudam-se os sentidos e outros tempos
acodem ao desespero nas procelas.
A sociedade acorda noutra cela
no universal presídio dos eventos.

Enquanto era sublime o sentimento,
justificando a sã filantropia,
hoje o repúdio à regra marca tento,
fundamentando o bem como utopia.

A dor da massa, então, faz seu protesto,
vindicando ao espírito social
a carta de intenções, um manifesto.

No abandono cinzento e carrascal,
o séqüito infeliz se sente resto
e exige se ab-rogue tanto mal!

TULIPAS

Flores do amor que colho, todas tuas!
São tulipas, ausência de perfume;
porém, iguais às ninfas, se resumem
belas misteriosas, meigas nuas!

Ao teu anseio, empresto o meu desejo
diante da flor, meu culto, minha figa,
que é a prova da emoção não muito antiga,
esculpida ao calor de mil ensejos.

Feliz, trago-te na alma, não te esqueço;
moras em mim, num canto de segredos;
dou-te tulipas, dou-te o próprio ser!

Esperando-te ansioso, te ofereço
estas flores colhidas no degredo
desde a primeira luz do amanhecer!

QUIMERA

Estranhos, como não, nessa distância,
trocando confidências ternas, puras,
num tratamento ao prumo da elegância,
ao zelo do elogio com ternura.

Sentidos explosivos, emoções,
carícias e promessas repetidas
nos sonhos madrigais, nas sensações
que em nossa alma sentimos refletidas...

Ao lado da lareira, bebo vinho.
Eis-me entregue ao pelego, na saudade
de quem sequer o corpo eu adivinho!

Sobre a mesa, papel, caneta e a herdade
composta pelos versos da verdade
abafando a ilusão dos meus caminhos.

NADA RESTA

Pressinto as forças cósmicas das horas,
transcendentalizando os ideais.
No espírito oprimido, o relampejo
da morte miserável me devora.

O frêmito do tempo lá de fora
é agouro transmissor dos meus presságios,
noticiando a presença de uma dama
conduzindo o capuz dos absintos!

Acode-me lavrar um testamento,
gravar o corpo inerte, frio e nu,
contra o asqueroso verme da imundícia!

Aos vivos, não pertence mais o morto!
Assume-o vorazmente o ser das trevas,
no ambiente putrefeito do sarcófago!

DEGENERAÇÕES

Arde o silêncio consumindo o tempo,
trazendo idéias de confusas metas.
A solidão consome o viço e as ânsias,
defenestrando as esperanças tantas.

A sombra avulta na alma fria e nua,
pedra e metal no coração sem força,
enquanto gira o corpo inerme em sonhos,
sob os moinhos das tragédias vivas.

Vozes sem boca, edificando o medo,
passeiam livres ao redor da espera,
assoberbando a carga estranha e bruta

que em vão trazemos sobre os nossos passos.
No caldeirão que ferve é só loucura,
é tiro, é soco, é sangue, é morte, é medo!

EM PARTE

De um pesadelo, atônito desperto:
saí das abissais escuridões,
da dor, da profundeza dos porões,
da tortura e da morte tão de perto!

Amargurado, acordo em norte incerto,
ao tremor de terríveis emoções,
sofrendo sob as trevas dos senões,
transmudada a existência num deserto!

Transpira o corpo entregue à prostração;
a memória vivaz mostra o retrato
do sentimento atroz que então vivi!

Vendo inerte meu pai, eis a emoção
da orfandade lavrada num contrato,
delineando que em parte eu já morri!

ARTISTA PLÁSTICA

A natureza deita aos olhos teus,
entrega-te os pincéis das belas-artes,
inspira-te à beleza até que fartes
ao comando de anseios corifeus.

Ao ver tulipas, rosas, margaridas,
vicejando nas telas do teu estro,
a própria primavera colorida
aturde-se na dúvida e no sestro.

É pérola teu sonho divinal,
ornato que realiza obras de encanto
aos meus olhos surpresos, de acalanto.

Mulher, amiga, artista, um bom sinal
que abraça a poesia universal,
pondo cobro ao amargo, a dor e ao pranto!

PARTIDAS SUCESSIVAS

Toda a ancestralidade agora sinto
dos que legaram a forma da genética.
Milhares de anos foram puro instinto,
no suceder das ânsias mais frenéticas.

A perscrutar, o espírito se arvora,
percorrendo os milênios tão distantes,
ao aguardo do tempo de ir embora,
vagar à eternidade irradiante!

Neste repositório que é passado,
de avós formando o texto do que somos,
choramos as partidas mais recentes.

É que entre o avô e o neto contristado
estão o filho e o pai dos microssomos,
no intimismo de dores tão presentes.

AMOR E VIOLÊNCIA

Toda a agressão é a antítese do amor,
pois deste aflora a vida e a poesia,
enquanto da violência emerge a dor,
o luto, a ira e a apócrifa heresia.

No primarismo rudo das paixões,
onde se nutre a cólera do caos,
ressumbra o instinto reles dos vilões,
formando contingente de homens maus.

Qual natureza assume esta desgraça,
se o milagre da vida nos conduz
ao sonho, à sorte, ao riso, ao canto e à luz?

Que a força da criação que nos enlaça
esparja sobre os homens sua graça!
O instinto hostil em nada nos seduz!

FUNERAIS

Ah, essas mãos terríveis, mãos de peste,
nuas, ásperas, frias, indecisas,
não são as mesmas mãos, então precisas,
do labor e carinhos incontestes!

Na despedida, lembro-me do adeus,
da vigorosa festa da esperança,
dos últimos encontros, da confiança
que trazia nas mãos, nos gestos seus!

Sem viço, arrumam-se acabadas,
guardando os calos vivos da aventura
custodiada aos carinhos doutros ais.

No entanto, agora a história é relembrada,
porque as minhas mãos na desventura
prometeram presença aos funerais!

GEMIDOS

Recordo a mureta do cais e nós dois,
sob o olor das algas, perfume das brisas,
ao murmúrio doce das ondas nas pedras,
palco das traineiras bailando silentes.

Um belo crepúsculo enchia o horizonte,
no enquanto do encontro dos corpos sensuais.
Meus dedos brincavam na tua cintura
e as mãos resvalavam no abismo das ancas.

Arfavas rogando carinhos e beijos;
teus seios pulsantes saltavam da blusa,
buscando a carícia da língua e dos lábios.

Aos últimos trilos das aves marítimas,
aos últimos raios da tarde desfeita,
abrimos a noite aos gemidos das ânsias.

LATIFÚNDIO IMORAL

Num piscar, os incautos são driblados
sob o manto abusivo dos falsários.
A regra é o surrupio e vale tudo,
nas sub-reptícias emoções.

No afeto engodatório dos calhordas,
órfãos, velhos, crianças e viúvas
soçobram indefesos e esmagados
pelos ardis das burras vivaldinas.

Avulta o latifúndio dos cretinos
sobre a herdade dos bons, dos sem malícia,
da sociedade vítima das petas!

Que a borduna moral do Judiciário
ceife a ação delitual dos ardilosos,
reimplantando o sossego nas comunas!

LIBIDO ARROJADA

Espero teus seios rosados e rijos,
teus lábios passivos, carnudos e doces.
Aguardo ansioso a umidade das coxas,
para energizar minhas mãos e minha alma.

Quero o teu murmúrio aliciando os sentidos,
o beijo indiscreto na dança das línguas,
os pêlos macios na pele sensível
e o corpo no corpo ao pulsar dos instintos.

O sonho é maduro; o desejo é infinito;
a espera é tensão que avoluma no peito,
no multiplicar das batidas cardíacas.

O ambiente é libido arrojado à explosão,
é trama a espreitar o gemido do êxtase,
enquanto os instantes da noite se esfumam.

GANHARÁS O UNIVERSO

Pretendo ter-te toda, conquistar
cada espaço do corpo envolto em seda.
Assim no mais, quem sabe, tu concedas
de uma vez só teus ais e o verbo amar!

Ambos lascivos, nus, num relampejo
transpassarão os círculos do tempo,
no encontro inaugural dos ais ao vento,
rompendo em gozo ao som dos realejos!

Despojado aos teus lúbricos desejos,
corpo imerso em tremores de ânsias tantas,
terás ao lado teu quem tanto encantas!

Na impulsão das ardências, ao ensejo,
ganharás o universo que antevejo
consagrando o amor que tanto cantas!

SONHO RARO E LEDO

Dá-me de beber teu murmúrio, teu segredo;
dar-te-ei amor ilimitado e tudo o mais,
durante o tempo inebriante do degredo
que, com certeza, na tua alma aviarás.

Ao lado meu, sob a ternura do aconchego,
ganharás meu calor, carícias sonhos tais,
que a um pensamento induvidoso logo chego:
esse degredo para sempre manterás!

E a descobrir a cada dia os teus enredos,
fará Justiça a decisão que tomarás
de não me ver em liberdade muito cedo!

Ao descobrir-te por inteira, dar-te-ei paz,
pois que terás vivido um sonho raro e ledo,
que a todo custo prolongá-lo tentarás!

SOLUÇÕES

Farfalham folhas secas, outonais.
Um lúbrico desejo me alucina.
Agito-me confuso e em cada esquina
convenço-me de que aparecerás.

As horas se sucedem, tu não vens.
As emoções explodem no vazio,
ratificando o amor que me sustém,
enchendo-me de ânsias e de frio.

A crença que impuseste à minha espera
materializa a fé em ter-te um dia,
sob o comando azul das sensações.

Entregue à monolítica quimera,
transformo o meu o instinto em rebeldia,
até que encontre a luz das soluções.

PECADOS

Soletrarei à luz dos teus pecados,
- pois és também arguta pecadora -,
aqueles da luxúria redentora
e os que apenas pensei, mas são lembrados.

E ao revelar-te tudo o que a alma fora,
no aventurar-se além do sonho alado,
certificar-te-ás que o aprendizado
rendeu-me alma lasciva encantadora!

Soletrarás, após, os teus pecados,
à sombra dos que enfim te confessei,
sem te esconder a mínima faceta!

Ambos, então, espíritos curados,
dar-nos-emos ao beijo que sonhei,
rumo ao maior pecado do planeta!

DESCANSO

Ei-lo na rede, após a pescaria,
a descansar, sereno, da labuta.
Recebe o vento à sombra do coqueiro,
recebe o sonho à luz da paz de espírito.

É o velho pescador, dono do mar,
dono da vida livre, da aventura.
Às tardes mormacentas deixa o oceano,
deita-se ao som das ondas e das aves.

Outrora vigoroso e destemido,
vencendo as tempestades e os naufrágios,
agora é servo atento das lembranças.

Andorinhas-do-mar daqui a pouco
Chama-lo-ão mais uma vez à lida,
num ritual antigo e misterioso.

O HOMEM DO MAR

O cheiro do mar, na odisséia que enfrenta
ao lado das ondas - saudade, sol, sal –,
modifica o homem, transporta sua alma
às ilhas da infância já tão castigadas.

Seus olhos se atiram às longas distâncias;
sua alma deambula perdida, sem norte.
Os ventos gerais sacrificam seu barco,
sacodem seus sonhos e as redes vazias!

A convicção de que o tempo passou
reside no cheiro das águas revoltas,
volvendo a lembrança às andanças marinhas.

Seu barco navega no mar da utopia,
os olhos embaçam, as mãos tremulejam.
O agora é naufrágio de sonhos antigos!

ANCIÃO ESMOLEIRO

Na miséria noturna e silenciosa,
o frio intenso açoita a carne nua
da velhice rendida e estertorosa,
diante dos cães, dos gatos e das ruas.

As notícias ressaltam dos jornais,
revelam-se colchão desguarnecido!
No sono, sonho rudo e carcomido,
travesseiro das dores colossais!

No silente sofrer, revela o pranto;
saudade acerba brota em desencanto,
sob o desprezo vil do desconjuro!

Mãos estendidas, doces acalantos
- foram socorro a aflitos e inseguros!-,
hoje são esmoleiras sem futuro!

ROSAS

As Rosas do mês de setembro balançam,
na festa das brisas chegadas do mar.
São virgens, são dóceis, são belas e amigas,
são rosas vermelhas de mágico olor.

Lá fora, as areias, o sol e os rochedos
entregam-se mudos perante a janela,
portal do teatro das rosas na jarra,
ao doce farfalho das alvas cortinas.

As rosas são temas que induzem a verdade
de um tempo coroado de amor e esperança,
regado a mistérios de encantos sem fim.

Ah, rosas antigas, maduras, intensas!
Ah, rosas do amor, da luxúria, dos éteres!
A vida exubera! Sois bálsamo da alma!

PLANTAÇÃO DE TULIPAS

(A tela “Plantação de Tulipas,da artista plástica
Guiomar Baldissera - capa do livro -, inspirou este poema)

Há muito encanto, há flores muito belas,
púrpuras, amarelas, onduladas.
Ao canto matinal, aves sem peias
dão vida a natureza matizada.

Erguidas sobre talos apontados
ao céu de transcendente azul anil,
aprumam-se no espaço campesino
para a estação da cor: a primavera!

Verdadeira pintura a deslumbrar,
eis o belo cenário da criação
deleitando a visão do ser humano!

São flores mui formosas debulhadas
sobre o verdor silvestre das campinas,
que atendem pelo nome de Tulipas.

NÃO DEMORES!

Aguardo-te ansioso, veias tensas,
entregue às impulsões do amor-abismo,
mascando as ordens tantas dos instintos,
sob o férreo tremor do corpo ativo!

Esperam-te lençóis alvos e frescos!
Debruçarei tuas ancas na almofada!
Teus lábios beijarei no afã das ânsias,
sob teus ais, teus gritos e gemidos!

Não demores, mulher, todo teu cio
será bandeira ao vento da libido
neste morrer de tarde em minha cama!

Não me atires ao meu próprio prazer,
solitário, sonhando com teu corpo,
a talhar meus lençóis com desenganos!

DISCURSOS INCONSEQÜENTES
Na fala inconseqüente dos afoitos,
proliferam conceitos comezinhos.
Na corrosiva voz da insensatez,
recrudesce a solércia na linguagem.

Os homens de honra e fibra se sustêm
ao freio inibitório do senso ético.
Porém, no mundo anódino dos biltres,
exala a fetidez dos imorais.

Infame necrotério de patifes,
eis as difamações, eis as injúrias,
eis as calúnias torpes congraçando!

Discursos do mais vil dos banditismos
eclodem dos tribunos sem caráter,
À luz canalhocrata das mentiras!

HIPOCRISIA

Há silêncio nas ruas, frialdade.
Evoluções funéreas e tristeza
brotam a cada esquina, com certeza,
sob o rito nojoso da maldade!

Há vazios nos gestos sobre a mesa,
ausência de calor, de caridade;
sobrepuja a total asperidade
nas almas sobejadas de avareza!

Vivendo sob os ventos outonais,
ao gosto da miséria mais profunda,
anciãos moribundos se aniquilam!

A solidariedade dos jornais
lançados à sarjeta mais imunda
é a dádiva dos ricos que cavilam!

DESTINO

Sobre as dores tamanhas que me assaltam,
por mil multiplicadas desde o início,
esclareço a razão dessa odisséia
estampando a ascendência mais primeva.

Sou caixa de segredo hereditário,
montada em gerações de antigos genes.
Trago bandidos rudes, salafrários;
homens de honra, aprumados e virtuosos.

Esse estado bifronte que se arruma,
quase embate animal a compungir-me,
sintetiza o sofrer que me atassalha.

Qual a razão central deste fadário:
viver envolto à vida dos enleios
para servir de liame às gerações?

TEU ÚLTIMO OLHAR

Lagoa dos Patos, encanto dos Pampas,
à luz das estrelas, do luar, das candeias,
nas noites de amor ao murmúrio das águas,
das ondas revoltas batendo no cais!

Morada das ânsias, do abraço e do beijo,
dos corpos candentes, quimera e prazer!
Visão do horizonte, do barco fantasma
que chega sem nunca chegar ou partir!

Assumo meu passo de dor e saudade,
trilhando a utopia dos meus desencontros,
rendendo-me aos ecos dos ais, dos gemidos.

À margem do tempo, tu és a miragem
vestida de branco no cais da partida,
negando à minha alma teu último olhar!

ANTES QUE AMANHEÇA

Remexo-me no incêndio das províncias,
penetrando subúrbios sem barreiras,
forçando as horas frescas das manhãs,
carregando a marmita dos apitos.

Garoto-propaganda das quimeras,
recém-deixado à margem da utopia,
ajeito o brim surrado do uniforme
para enfrentar as filas do outro mundo.

Mecânico gestor do arroz com ovo,
marcado pra morrer em data incerta,
engulo as emoções em tiras vivas.

O coração da fábrica é de pedra.
Meus pés mastigam ruas de aço puro.
Quero sumir bem antes que amanheça!

LEGADO

No inconsciente confuso e indecifrável,
imagens distorcidas, fantasmais,
alinham-se à balbúrdia da ascendência,
numa revolução de angústia e medo.

Há muitos sons estranhos, limo e pó
nos lugares antigos do meu sangue,
mostrando-me a tragédia sucessiva
que desemboca negra às descendências.

Ao ver-me nos milênios da criação,
acocoro-me à margem das idéias,
tentando um entendimento sobre a vida.

Também hoje reflito sobre as chagas
profundas e antiqüíssimas que trago,
como guardião dos males das heranças!

OLHA ATRÁS

Ao saber que nasci para viver
e ao sentir que viver eu não vivia,
perguntei para o mundo o que faria
pra acabar de uma vez tanto sofrer!

E jogando perguntas pelos ares
sem, no entanto, obter resposta alguma,
conduzi minha nau por estes mares,
amargurado pela vida em suma!

No entanto, certo dia alguém me disse:
“Por acaso tu pensas que viver
é aventurar-se somente sobre a sorte,

ou ter aos pés a vida que sorrisse?
Olha atrás dos teus passos a sofrer
a multidão para a qual só resta a morte!"

CARNEIRO DAS SUCESSÕES

Toda ancestralidade agora sinto,
nos legados egressos da genética.
Milhares de anos foram puro instinto,
abismo, escuridão, pulsões herméticas.

A perscrutar, o espírito se arvora:
antigo e dos milênios tão distante,
ansioso espera o instante de ir embora,
vagar à eternidade conflitante!

Neste repositório que é passado,
dos bisavós, contexto do que somos,
choramos as partidas mais recentes!

É que entre o avô e o neto constritado
está o pai, a voz dos microssomos,
legando-nos as dores mais pungentes!

SENSUALIDADE

Quero o gesto das mãos como brinquedo,
seja o teu beijo pura fantasia.
Ao lume da ilusão que se faz chama,
decifrarás o amor devagarinho.

Ao inteiro dever do verbo-encanto,
entrego a frase ativa do meu sonho,
para, em volteios, livres de pressões,
fazer-te entregue aos jogos sensuais.

Na quietude da noite faço festa,
com meus versos elétricos, sem rima,
encobrindo as entranhas do desejo.

Mas quando finalmente despertares,
sob a maturidade dos anseios,
serás sensualidade à flor da pele.

TUA BOCA

Tua boca é verbo forte, belo e intenso;
é verso sem medida; é canto nu;
é abismo projetando à imensidão
o gemido apertado em línguas tensas.

Tua boca é a primavera do desejo,
que esparge o olor maduro das florinhas,
quando o corpo inteiriço se habilita
ao frêmito dos êxtases sem freios.

Tua boca se transforma em precipício,
quando tomo teu rosto em minhas mãos
e mergulho nas chamas dos teus olhos.

Tua boca é a fonte, o início dos sonetos,
onde deflagro as ânsias da libido,
em busca do tremor dos lábios teus.
SERVIR DE LIAME ÀS GERAÇÕES

Sobre as dores tamanhas que me assaltam,
por mil multiplicadas desde o início,
esclareço a razão dessa odisséia
estampando a ascendência mais primeva.

Sou caixa de segredo hereditário,
montada em gerações de antigos genes.
Trago bandidos rudes, salafrários;
homens de honra, aprumados e virtuosos.

Esse estado bifronte que se arruma
quase embate animal a compungir-me
sintetiza o sofrer que me atassalha.

Não sei se é azar ou sorte a nossa sina
de receber da vida tanto enleio
para servir de liame às gerações.

HEREDITARIEDADE CORROMPIDA

Enquanto a morbidez do instinto humano
ratificar presença nas condutas,
como obter a exata solução
para os graves problemas sociais?

Inteligências magnas sucumbem,
diante da vil fraqueza do caráter.
Ao pó e à lama pútrida lançaram
quem já foi bom e que hoje vale nada.

Os mistérios que guardam as profundezas
da psiquê sofrida pelos séculos
dão mostras da difícil indagação.

Explicando, o atavismo não consegue
justificar as tristes conseqüências
da hereditariedade corrompida.

CÓDIGO PENAL PARA OS HONESTOS

O espírito liberto da cambada,
que se dedica ao crime e fica imune,
confirma a superior condescendência
dos códigos penais de todo mundo.

No atrevido rompante dos achaques,
na festa da partilha delitiva,
prevalece o tripúdio sem-vergonha
sobre a moral já tanto solapada.

Justificando a débil Instituição
da reprimenda aos bárbaros desvios,
codificam-se normas absurdas.

Nesse trajeto anômalo de leis,
teremos brevemente sancionado
o Código Penal para os Honestos!

TRAGÉDIA DOS POETAS

A universal tragédia dos poetas,
que traçam versos sobre a sordidez,
dorme no ataque espúrio dos velhacos
que assomam no ostentar a carapuça!

Como veste esmerada de alfaiate,
ou luva que se ajuste à mão do dono,
os versos dos poetas também rompem
espíritos desnudos e devassos!

Quando emerge o patife escorraçado,
sob a força da peça literária,
poetas que se cuidem da peçonha!

Porém, ferido o pulha, ao rés-o-chão,
lança-lo-ão à rocha dos abutres,
na vitória moral da poesia!

IMPRESCRITIBILIDADE

Não sendo verdadeiro que se goste
de conviver com a lama social,
como explicar o aplauso de alguns tantos
ao instituto vil da prescrição?

Sob o meu céu, não morre o desrespeito;
o imoral não prescreve, é perseguido!
Alguém existirá que se imagine
capaz de deletar máculas da alma?

Ora, ora! Pensar nesse sentido,
isto é, sepultar nódoas morais,
só reparando os danos provocados!

O ato vil, aprendi, deixa indelével
as marcas ferreteadas no infrator,
pois a imoralidade não prescreve!

FOME

A semente da fome foi lançada;
por enquanto germina frágil, muda.
A agricultura infértil e maquiavélica,
ambiciona colheita de extermínio.

A multiplicação desordenada
desacredita os sensos demográficos.
No campo e na cidade, o que se vê,
senão a ingente luta lombriguenta?

Quais faquires lançados à redoma,
forçados pela crua situação,
entregam-se ao letargo dos silêncios.

No entretecer do enredo tenebroso,
preparam-se na escola dos famintos
para o vestibular da insanidade!

INDIGNOS

Apontam-se as manobras dos falsários,
descobrem-se os caminhos das serpentes!
É a guerrilha dos pulhas nauseabundos,
perpetrando o ativismo dos canalhas!

Atassalhando a corja do cinismo,
Achincalhando a torpe covardia,
Meu verso repudia as falcatruas
que há milênios carcomem a sã moral.

O sonho acalentado é ver por terra
as imoralidades que se avultam,
no contexto da escória repulsiva.

Deixar no front, após a luta, os biltres,
estendidos aos corvos e as hienas,
e festejar a queda dos pelintras!

DESILUSÃO

Alimento o desejo de dizer-te
que trago os mil mistérios das paixões;
mas vacilo, simulo olvido e flerte;
sobre o tema, encoberto as confissões.

Eis o que sinto, muito mais que tudo,
assumindo meu corpo, tomando a alma,
fazendo-me perdido e tartamudo,
edificando o caos, rompendo a calma.

Não me encorajo; assumo a dor e o pranto,
retraído em tristeza e solidão,
entregue ao descompasso da emoção.

Multiplicam-se o abismo e o desencanto,
anulam-se os sentidos sacrossantos,
no processo da vil desilusão!

PERITAS RATAZANAS

Nas reuniões dos trambiqueiros de gravata,
- belas laçadas, colarinhos engomados!-,
são projetados uns engenhos arrumados,
mostrando as trilhas de quem furta e de quem mata!

É tanta gente neste imbróglio misturada,
roncando grosso no vestir mais apurado,
que dificulta a distinção do ror safado,
a fim e que se veja a gang processada!

Enquanto a história desenrola caso a caso,
o contingente desastroso dos pastranas
pratica vis ações, conduta torpe e insana!

Neste roldão, a elite mostra seu descaso,
enquanto o povo permanece em prato raso,
cego à conduta das peritas ratazanas!

ABISMOS DO INFERNO

Saudade que chega, saudade que fica,
saudade que assume e esporeia minha alma!
Pergunto se a trama que teces às noites
são forcas fatais aos meus débeis sentidos!

Saudade que à voz traz embargo e lamento,
tisnando meu tempo de amargo profundo,
marcando meu corpo ao ferrete da insônia:
não tragas mais dores aos meus sofrimentos!

A vida que vivo, de sombras tomada,
não tem mais a luz e o vigor que suportem
os males que trazes nas noites de angústia!

Prefiro morrer afogado em meus prantos,
do que te aturar sob a dor dos meus dias,
tornando os instantes abismos do inferno!

ESPERANÇAS

Assunto esperanças guardadas acesas,
entregue ao labor do partir sem destino.
Projeto aventuras e amores distantes,
seguindo o trajeto da estrada sem rumo.

Libido aquecida ao fervor dos desejos,
o corpo se agita na busca da sorte,
seguindo o compasso do sonho que indica
o beijo e o abraço do êxtase puro.

O peito desnudo penetra caminhos,
é sanha incontida levada ao prazer.
Nos portos da vida, chegar é preciso,

deitando a emoção sobre os corpos entregues.
Assunto esperanças guardadas acesas,
que empurram minha alma a traçar novos rumos.

DESEJO

Teu corpo é mistério escondido num tempo
que ao tempo se lança em segredo abismal.
Teu corpo é a emoção atirada na areia,
sereia de encantos que mora no mar.

Teu corpo é brinquedo aos meus olhos de sonhos,
paridos do ventre do êxtase puro.
Por isso, me arrimo em desejos ardentes,
com os dentes trincados no instante da espera.

Teu corpo é floresta, é deserto, é oceano,
é emblema-colosso, é elemento vital,
é a festa de luzes que ofusca minha alma.

Teu corpo é a insistência da minha libido
que andeja em noturna e insistente emoção,
sonhando o milagre do encontro explosivo.

ARREMEDOS E PATIFES

O ser que emerge é trapo, é o anti-ser
da tramóia que estampa novos tempos.
É o mesquinho do arbítrio, o desprezado;
é o dono da emoção dos rebotalhos;

é o pária que permeia as ilusões,
a chancelar insípidas sentenças,
sufragando discursos mal forjados
ao rigor de moral parcializada.

Não largarei sem rumo as ordens pétreas,
princípios que enobrecem a raça humana,
em favor de arremedos e patifes!

O povo esfrangalhado jaz perplexo
diante da corja pútrida e imbecil
que empurra nossa pátria para o abismo!

INSINUAÇÃO

Entrego-me à recíproca do abraço,
à mornidão do corpo, aos seios túmidos,
rendendo-me lascivo ao teu regaço,
aos teus olhos febris, curiosos e úmidos!

Tuas mãos de seda atiram-se às carícias;
teu pundonor se aquieta; emerge a ardência
aureolada à libido com cadência,
visando as transcendências e as blandícias!

Eu, meigo, acudo todo teu desejo,
dou-me à libido, vibro sem ter pejo,
enlouquecido com as doidices tuas!

No apronto da peleja, mais um beijo,
almas em transe, puras, lindas, nuas,
iniciando a aventura que insinuas!

TRAMA

Na trama contínua que envolve o meu ser,
evoco as lembranças de mágicos tempos,
vivendo teu corpo nas horas de engano,
com os olhos cerrados aos duros instantes.

Sei lá onde estás neste agora emotivo,
mas juro que sinto a vontade cigana
de ter os caminhos aos pés dos meus passos
e então procurar-te por todos lugares,

até que eu encontre teus olhos nos meus.
Menina, teu corpo é segredo bandido
fazendo sofrida esta espera sem fim.

Que a súplica seja atendida por ti,
a fim de que faças teu corpo estender-se
ao lado do meu, numa alfombra de amor.

VENTURA ACESA

Não te direi agora tudo. Não.
Há desejo incontido de escrever-te.
Como não haveria, se minha alma
de tanto amor explode de emoção?

Mas revelar os sonhos, todos eles,
é impulso que contenho a todo custo,
até que num momento se avizinhe
a hora derradeira dos limites.

Não sei a quantas anda o teu destino,
os teus desejos e ânsias reprimidas,
nessa ventura acesa que te rendo.

Eu te diria tudo, sem problema,
Mas se o teu coração descompassasse,
A requerer as minhas confissões!

VERMES

Ouço lá fora os passos decididos,
sobre as folhas do outono já tardio,
do mensageiro negro de além túmulo.
Vem levar meu amigo mais chegado

que no leito de dor conclama a morte,
qual moribundo e trapo em desespero.
Chegando, o encapuzado não reclama
que o tempo da partida seja tardo,

pois sente o amor que ainda o prende à vida
e a força da ciência que o mantém.
Mas do leito ressona aflita súplica

requerendo o desate da alma pura,
porquanto se antecipam no banquete
os desassossegados vermes vis.

FOGO-FUGA

O sonho inatingível me persegue,
a rosa murcha da esperança sofre,
o tic-tac do relógio pára.
O sonho inatingível me persegue!

A obra transformada em lantejoulas
é terra desgraçada, não produz.
Os ossos coloridos que derretem,
são lavas a escorrer dos olhos tantos,

transmitindo a emoção da dor perene.
Vingam as ervas daninhas da tragédia.
Ah, sonho inatingível que persegue

o eremitão que foge a todo custo!
Estrada pedregosa, trilhas ásperas,
infância confundida em fogo-fuga!

SUBTRAÇÃO DA FÉ POPULAR
(1996)

O nosso ordenamento social
há muito é espicaçado por quem tem
a obrigação legal de preservá-lo.
É contingente imenso de farsantes!

São filhos do sufrágio popular
-e espanta que estes partos tenham êxito!-
É gente criminosa, é corja vil
prometendo à comuna a redenção!

Discursos dissonantes, malsinados,
carregados de engodo, hipocrisia,
depauperam a fé do povo crente!
Interesses bandidos se agigantam
sob a coberta espúria e fraudatória,
lesando a Pátria Amada Idolatrada!

DE VERSO EM VERSO

O que jamais vivi, revivo intensamente,
lavrando a história da ilusão sem preconceito,
sentindo minha alma em devaneio, livre e nua,
cantando o que foi sonho em versos de prazer.

Desnudo amantes que não tive, dou-lhes beijos,
sinto seus corpos nas alfombras setembrinas
e alcanço o êxtase seguro nos mistérios
da conjunção do amor, das ânsias e da paz.

No dadivoso mergulhar da alma nos sonhos,
emerge o esteta e a inspiração concupiscente,
multiplicando a poemática do enlevo.

De verso em verso, pois, meu canto assume as horas
do que jamais vivi, mas que sempre senti,
acorrentado à dor, à farsa e à frustração.

BANALIDADES

No gigantismo das polêmicas banais,
onde o debate se acalora em força fútil,
a causa nobre é postergada para o inútil
e as abjetas conclusões vão pros anais!

E nesse enredo inglório e parco faz-se a História,
move-se o mundo na engrenagem do absurdo.
Vinga a miséria, a fome, o crime e a dor notória;
segue o Poder rendido, cru, cínico e surdo!

Enquanto afunda o ser humano em dor pungente,
amalgamado à vida espúria da incerteza,
o congressista microcéfalo nos mente!

Dormindo a pauta da verdade sobre a mesa,
pelos quadrantes, infortúnios se ressentem,
dando-se conta, nos discursos, da vileza!

COBAIAS

Acordar para os túmulos que um dia
abrigaram avós da eternidade;
sentir que somos toda a quantidade
dos milenares truques da eugenia.

No processo incessante que aprimora,
assusta ver o ser dono da herança
que o transforma na bomba da esperança
pelo futuro afoito que o devora!

É que emergem conflitos da consciência
(de gerações, morada inexorável),
por entender que é parte da experiência.

Sentir-se, pois, um ser exterminável,
meio-termo nos testes das ciências,
terrifica nesta obra interminável!

UM POEMA DE VERDADE OU À VERA

Mulher guerreira e livre, eis o que és,
vergastando as elites raposeiras,
este que é o fruto ambíguo das sonseiras,
submetendo o povo humilde aos pés!

Mulher sagaz, sensível,amiga e justa,
de ideário fundido em ação concreta,
marchas sem medo à luta mais discreta
assegurando a paz à Pátria augusta.

Tua voz se alteia contra o escroque e o vil,
politicalhos do grupo escurril,
tecendo trama em busca do poder.

Vai! Segue em frente! É hora de entender
que a corja astuta é escória no Brasil
e não demora muito a se render!

...E TU NÃO VENS!

Mas eis a natureza: mulher-ninfa,
sensualidade pura, anjo explosivo,
retrato do desejo ebulitivo,
sob o encanto dos lábios e dos seios.

Ah, sonho de algodão, sonho de nuvens,
calor a temperar-me as ânsias nuas!
Ouço tua voz, teu corpo ronda o quarto;
mais uma vez me quedarei sem ti!

Conheces (e quem não?) as ilusões
forjadoras do atônito esperar,
à luz das sensações e dos torpores!

A libido se espraia sem fronteira,
o tempo escorre solto à noite fria
e tu não vens matar os meus vazios!

PENÚRIA

Sou homem, és mulher, somos dois seres,
heranças do milagre mais primevo,
trazidas ao presente em doce enlevo,
sob a constância viva dos prazeres.

Marcamos nossa carne e as nossas ânsias
ao rigor mais antigo dos costumes.
É que no amor não vingam discrepâncias,
e no êxtase não há dor ou queixumes.

Sensações primitivas, puro instinto,
confesso-te ao dizer-te que não minto,
ao reafirmar meus sonhos de luxúria.

Na madrugada fria, o que mais sinto
é a distância agourenta, atroz e espúria,
rendendo-me saudades e penúria.

DOIS BARCOS

Exubera cenário de magia;
avulta a penedia no horizonte,
contraforte das ondas tempestuosas
junto ao mar de ordinário em mansidão.

No firmamento, cirros multiplicam-se,
estampando no céu azul-anil
figuras de objetos, gente e monstros,
como num teatro infanto-juvenil.

Exsurgindo no palco dessa festa,
dois barcos ancorados lado a lado
ao vento alísio traçam seus destinos.

Um par de embarcações em tinta e cera,
entregues a mistérios, solitárias,
é obra da pintora Baldissera!

O GATO BRANCO

Encontrei na calçada à noite, exausto
e abandonado, um lindo gato branco!
O coitado miava à luz da lua,
talvez sentindo fome, sede e frio.

Agora ronca e dorme a sono solto,
sobre pelego fofo, seu presente,
depois de tomar banho de água quente
e após jantar um peixe e tomar leite.

Coração explodindo de euforia,
ao ronronar sem freio, em novo lar,
ei-lo modelo nu às pinceladas!

Como se vê da tela que o retrata,
o felino está gordo e bem feliz,
no ateliê da artista que o acolheu!

AOS PECULATÁRIOS DA REPÚBLICA

Quem és, vil passageiro da existência,
corrompedor da fé dos miseráveis,
dono da ação doentia do escalpelo
sobre as vítimas nuas da exclusão?

Quem és, lorpa imbecil, riso de hiena,
ratazana dos breus subterrâneos,
baba de cão raivoso, doidivanas,
mutilador dos sonhos infantis?

Rogo-te praga, berne de mosquedo,
para que morras seco ao sol a pino,
ao lado da imundície das sarjetas!

O dono da agonia serás tu!
Serás excomungado para sempre!
Teu coração será pasto de urubus!

SAUDADE

Ardência incontida percorre meu corpo,
ao tempo em que sinto um aperto no peito.
Voltar! Que desejo impossível este verbo
roclama aos sentidos tomados de dor!

As horas findaram; os beijos e abraços
são sombras de arquivo de antigos desejos.
Ah, quanto te quis nesses dias vazios!
Ah, como sofri sem teu cheiro e tua voz!

Orgulho sem freios travou meus impulsos,
enquanto os meus dias ao pranto cederam,
minando a existência ferida de morte.

Teu tempo, tua vida, teu corpo, teus ais,
teus sonhos tão simples, mas cheios de graça,
perdi tudo, amor, à exceção da saudade.

VEIAS SEM SANGUE

Volúpias sucessivas que se esfumam,
no abrir e no fechar dos olhos úmidos.
Eis-me, então, no enquanto das vontades,
nuvens que se desfazem, sonhos findos.

Essa espera sem tempo é espera tensa,
fugazes emergências dos impulsos.
O gesto, o olhar e a voz estão distantes,
acompanham-me as sombras e os fantasmas.

Nas esquecidas folhas, sobram versos,
edificados sobre cinzas frias,
tentando resgatar tensões antigas.

Estamos sem estar, veias sem sangue,
como as noites morrendo nas manhãs,
como as ondas deitando nas areias.

AMOR INDESEJADO!

Com ardor, cantei o amor sem freio, inesquecível,
nutrido à intensa luz de uma paixão ardente!
Por esse amor sofri tortura contundente,
no desnorteio amargo e insano do impossível!

À luz do amanhecer, a imagem bela e nua
emerge resplendente, encanto etéreo e doce.
E de repente a dor é realidade crua,
toda aquela ilusão do que eu sonhara fosse!

Agora, frio e mudo, entregue às horas mortas,
ao rigor tumular do que restou e existe,
não quero mais sofrer esse amor que a alma exorta.

Olvidando de pronto a voz que ainda resiste,
tento abrir de uma vez a venturosa porta
para entregar-te ao léu, levando os meus despistes!

AMOR QUE SE ESFUMA

Rendo-me à incerteza do verbo mais cru,
dos teus gestos vagos, das noites vilãs.
A força explosiva do amor extremado
agora é porão de desejo mofado.

Deito ao som da rima perdida no tempo,
amor-desamor, desencontro, procura,
como um potro guaxo na relva do sonho,
entregue à amargura e à emoção terminal.

E a lascívia, os beijos, olhares, carícias?
Sei lá dos encantos, do mágico gozo!
Lançaram-se ao vento, desgaste das horas!

Agora teu corpo é miragem na areia,
ferrete abrasando a memória que esfuma,
levando as lembranças ao pó do esquecer!

SONEGAÇÃO

Participo das buscas ao teu lado,
procura indefinida, precipícios,
sob as manhãs incertas dos meus vícios,
aprendiz no teu corpo aventurado.

Se tanto eu desconheça desde o início
as razões do teu gosto inconformado
- tanto que ele é o escopo procurado -,
em ti não desconheço os artifícios!

A nudeza, tesouro que me entregas,
filha da intrepidez concupiscente,
transforma a lucidez em obsessão!

Perdido na refrega da emoção,
sinto a tua lascívia tão presente!
Mas noto que tua alma me sonegas!

SOMBRAS

As sombras noturnas das ruas estreitas
misturam-se aos vultos perdidos na noite.
São seres sem rumo fugindo do açoite,
buscando um destino mais livre de espreitas.

É gente esperando que a dor não se afoite
matando esperanças à luz das suspeitas,
forjando emboscadas no assomo das peitas,
nos vãos criminosos do horror da entrenoite.

Ao som dos latidos esparsos que ecoam,
ao passo inseguro do medo ante a trama,
as sombras sobejam, medrando desgraças!

Os cantos noturnos e antigos ressoam;
arruma-se o caos sobre o vil panorama,
enquanto a miséria se esconde da ameaça!

PÁRIAS

Colheremos o fruto do prazer,
nas árvores frondosas do labor.
O alimento colhido da inação
resulta da indolência, é sem valor!

O trabalho é a certeza inabalável;
nascemos para a luta, este é o destino!
Ao desprezar a lida e as emoções,
conquista-se o opróbrio e o desencanto.

Imensos contingentes vagabundos
vagam na ociosidade, improdutivos,
à vida marginal predestinados.

A universal tendência à malandragem,
que grassa qual intensa epidemia,
pelo mundo constrói currais de párias!

ACEITAREI O FADO

Instala-se um silêncio de mistério
no coração tomado de senões.
As multifacetadas emoções
encontraram repouso em monastério.

Antes assim: razão, tino e torpor
sirvam de manto augusto ao meu critério,
revelando ao desejo a luz do império
de uma força maior que o próprio amor.

Se no amanhã da espera tão sentida
eu colha os louros da difícil lida,
festejarei as dádivas com vinho!

Mas se em lugar do prêmio e da guarida
sobeje o sofrimento nos espinhos
meu fado seguirei sem seus carinhos!

DEUS POR UM SEGUNDO

Do amor, a chama ardente mais se aviva,
voluptualizando os meus sentidos.
Fogoso, o sentimento da libido
impulsiona-me e o corpo mais se ativa.

À sombra do prazer que na alma aninho,
diante da sorte augusta dos neurônios,
enfrento a força estranha dos demônios
e ganho o céu na cama em desalinho.

Se não bastasse a vida e a natureza
e as cores do crepúsculo extasiante,
dentro de nós trazemos outro mundo.

É um mundo mais vibrante, com certeza,
que empresta ao ser humano a delirante
sensação de ser Deus por um segundo.

NOVAS PELEJAS

Os corpos vibrantes se deixam apanhar
na mútua procura dos íntimos ais,
formando um só bloco de acordo emotivo,
ao som do murmúrio das vozes em festa.

Os anjos se esquecem da vida e da morte,
enquanto as canções das marítimas ondas
abafam gemidos dos deuses do amor.
Cumprido o prazer com o advento do êxtase,

os corpos se espraiam, prostrados, entregues.
A sombra da noite aproxima os amantes;
embalam seus sonhos, entregam seus corpos,

buscando o descanso que acena o amanhã
de novas pelejas, viagens sem conta,
aos novos impulsos do mágico evento!

CHÃO

O copo embica, o grito se esparrama.
O sonho é infinitude em alguns segundos.
Dedos podados, olhos de lampião,
rosnado agudo, pés fora do chão.

A sombra aturde, chega de mansinho.
Há pólvora espalhada pela noite,
há chumbo de balins no corpo quedo.
Enquanto isso, a palavra é verbo aceso,

rompendo esquinas mágicas sem nome.
O sangue se sustém negro e vermelho,
agora na calçada de silêncio,

aos olhos da esperança que se embruma.
O norte estremecido e sem fronteira
rasga o sentido tenso em gritos nus!

ROMPENDO ESTRELAS

Das fronteiras distantes, te acompanham
os colossais segredos da libido,
tornando-te sensual e desejada.
Hoje escondo a tensão que propiciaste

ao sistema neurônico do homem,
rompendo seus limites de luxúria.
Serás, ainda amanhã, doce mistério,
tomada em rebeldias, cios, tramas.

Então, eis porque rompes tuas selvas
e fico aqui rompendo estrelas tantas,
imaginando um verso que consiga

fazer-te entregue aos meus desejos puros.
Rompendo estrelas, sim, rompendo estrelas,
sofrendo a inspiração dos teus sussurros!

MURMÚRIO

Ouço o murmúrio tênue que me traz a brisa
E me entorpeço todo com a saudade intensa
dos bons momentos que passei, das desavenças,
do amor vibrante, às vezes quente, e até das brigas!

Ouço o murmúrio brando na alma entristecida
e faço aberto o livro inteiro da saudade.
E então pergunto: “Quantas, quantas foram as tardes
de intenso ardor que dediquei e que ainda existe?”

Ouço o murmúrio que me chega quase em vão,
Um reclamar plangente, assaz doído, intenso
Um lamentar choroso a me pedir perdão

Ouço o murmúrio e lhe respondo: “Não venço
neste meu corpo o entusiasmo e a vibração,
pela mulher que, num murmúrio, me deixou.”

DE REPENTE

Rompo em decrescente afago
descendo as mãos pioneiras
formatando o azul anil
paisagens do desejo

Desço e desço muito mais
ramos galhos folhas nuas
grama toca ebulição
fotografando emoções

Escarpas ventos vazios
eis-me escorrendo ao mar
maresia canto vivo

De repente louvo o grito
libido sonho maduro
e subo subindo o beijo

ÊXTASE COM ARTE

Quero sentir teus pêlos eriçados,
quando beijar tua nuca perfumada,
tomando-te por trás numa emboscada,
à luz de um erotismo enfeitiçado.

Refeita da surpresa, então beijar-te,
assumir por inteiro o corpo ardente,
sob a volúpia mais do que suficiente
para levar-te ao êxtase com arte.

Não seja de fumaça e de quimera
o reencontro, depois de tanta espera,
ao vigor da saudade e do desejo.

Façamos deste inverno a primavera.
Sobre os lençóis, arfantes, sob arpejos,
entrega-me tua boca para os beijos!

LEMBRANÇA

A emoção da lembrança pouco importa:
é resto, é cinza, é tempo remexido,
tantas vezes de fato não vivido,
que apenas nos ilude e não conforta!

Norte desencontrado, onde o sentido
revela-se exaurido e coisa morta,
aturdindo a memória e abrindo a porta
de fatos que se quer ver esquecidos!

Rumo incerto, procura indefinida,
sonhos vagos percorre o peregrino,
perdendo as horas caras do presente!

É sorte espúria a espera empedernida,
ilusão de veneno diamantino
de quem não terá mais o amor ausente!

NÃO ME DEIXES À ESPERA

Aguardo-te ansioso, veias tensas,
rendido às impulsões do amor-abismo,
mascando as ordens tantas dos instintos,
sob o férreo tremor da nervatura.

Aguardam-te lençóis em desalinho;
tuas ancas, renderei aos travesseiros!
Teus lábios beijarei no afã do gozo
sob teus ais, teus gritos e gemidos!

Não demores, mulher, todo teu cio
será bandeira ao vento da libido
neste morrer de tarde em minha cama!

Não me faças rendido ao prazer meu,
sozinho a imaginar teu corpo nu,
talhando os meus lençóis com o que desejas!

VAMOS, ACORDA!

Não pretendo a mudez. Quero assanhar-te,
bulir com teus neurônios luxurientos,
ver-te sorrir, correr de encontro aos ventos,
e que de liberdade tu te fartes!

Quero sentir teu corpo impregnado
do olor mágico e puro das florestas;
ao depois, nossos corpos lado a lado,
transformando os desejos numa festa.

O teu desejo vivo e ilimitado
explodirá no anseio do erotismo,
culminando no êxtase dos deuses!

Vamos, acorda agora e me acompanha.
Deixemos para trás este silêncio,
pois sei da tua ardência e teus tremores!

SOLITÁRIO

A tua boca rubra cheira a flor;
teus seios doces são duas romãs;
teus olhos, contas negras misteriosas;
as tuas mãos, tentáculos de amor.

Teu corpo é molde augusto da beleza;
teu beijo é aviso prévio dos prazeres.
És fonte inesgotável de ânsia pura,
nas noites luxurientas dos embates.

No lúbrico estupor das horas gratas,
entregas-te desnuda, amante eleita,
qual fera em cio intenso e sem limites.

São teus os predicados que enalteço,
após possuir teu corpo nos meus sonhos,
na aventura de um quarto solitário.

DANDO UM TEMPO

Quero-te nua, ardente, meiga e acesa,
sobre os frescos lençóis da minha cama.
No calor do desejo que se inflama,
fundiremos as almas com certeza.

Sem tempo de retorno, viajaremos
aos páramos tomados de blandícias
para provarmos, lá, suas delícias,
nos entrementes do êxtase supremo.

Quero-te agora, no ápice do cio,
no supremo festejo da luxúria
clamando-me por sexo com fúria.

Ao peso da memória, vivencio
teu corpo esfogueado e me alivio,
dando um tempo aos rigores da lamúria.

NÃO ME CONDENEM, NEM ME ABSOLVAM!

Sob a luz mais intensa dos caminhos,
levo o meu corpo e o livro aberto da alma,
mostrando os meus pecados, que são tantos,
lavrando em penitências, que são muitas!

Procuro a infinitude do destino,
na efêmera passagem pela vida,
na dor das horas sobra-me algum riso,
diante da chance aberta à eternidade!

Se a História do trilhar amargo teço,
sem prantos, atendendo à provação,
longe a condenação... nem me absolvam!

Desejo liberdade, prosseguir,
romper meus infortúnios, o meu fado,
poder de tempo em tempo ainda sorrir!

LABAREDAS

Seguro a tua mão verde e me aproximo
da ingenuidade doce dos teus olhos.
Teus ares são de ninfa ao desamparo
sob o universo astuto dos desejos.

E tremem tuas mãos, tremem teus lábios,
brincadeira instintiva da libido,
num milagre fazendo-te a mulher
que brota dos mais íntimos sentidos.

Este mistério empurra-nos aos sonhos,
encontro arrebatado, amor-limite,
ao comando das regras da criação!

A natureza ativa os teus impulsos,
agora és chama viva do erotismo.
Aprontemo-nos, pois, às aventuras!

INJUSTIÇA

Não falo por ninguém, falo por mim,
na selva magistral de homens – anões!
Na regra do repúdio, canto o fim
do caráter levado às servidões.

Indago: qual a força que ainda resta
de firmeza, dever, dignidade,
que se assoberbe numa grande festa
e denuncie espúrias inverdades?

Fazem da covardia uma virtude,
pincelando de mérito a omissão,
no contingente enorme que se atiça.

E sozinho, meu Deus, antes que eu mude
pra outra vida, aqui marco a posição
de quem sempre lutou contra a injustiça!

SILENCIAR

Na irreverência abrupta do afoito,
desconsolado e fútil, da tribuna,
sacode vitupérios e ameaças,
tentando sustentar o insustentável.

Ledo engano de quem se vê perdido
e parte pros insanos vis caminhos.
A Justiça, o Direito e a Lei consagram
o pensamento reto da Verdade.

E decretar que o mundo inteiro sofra
da obumbrada cegueira e da burrice,
é ser tão burro quanto o seu decreto!

Aquele que não cede aos sãos princípios
e aquele que boicota a sã moral
é torpe, é falho e deve silenciar!

DESERTO FRIO E ERMO

Acordo atônito de um sono de quimera;
em derredor, percebo a vida, a realidade.
Foram-se os anos, com eles foi-se a primavera
e o pesadelo de rompante é que me invade.

Vem-me à lembrança a história triste do abandono
das catacumbas solitárias do deserto.
A lucubrar, a paz eu perco e perco o sono,
sob emoção atroz, sentindo a morte perto.

Não que eu deseje a eternidade pra viver,
ou ter guardado o privilégio de escolher
o encontro aquele que ditasse o fatal termo.

O que carcome minha alma e faz entristecer
é o pensamento de que em breve irei morrer
sob as esperas de um deserto frio e ermo!

RAROS ENCONTROS

Quero a emoção dos beijos escondidos,
chantagem viva, rogo sem limites,
ao lume da lascívia traiçoeira
persuadindo a mulher que ainda resiste.

Acolho o titubeio da incerteza,
mudez e vozerio simultâneo,
nos rápidos encontros permitidos,
à luz da vela-amor indefinida.

Há montanhas de dúvidas perversas
afugentando a erótica impulsão
do desejo voraz e clandestino.

Entretanto, não quero que se esvaiam
esses raros encontros do prazer,
junto ao corpo sensual que me alucina.

ESTÁS PRESENTE

A sombra do pecado que te marca
é muro que se posta ao meu desejo.
O brilho dos teus olhos denuncia
a ardência do teu corpo erotizado.

Então, na febre lúbrica das horas,
trago meus nervos vivos em conflito,
porquanto estar contigo simplesmente
já é um revelar às vistas curiosas.

Assimilo, portanto, a condição
de viver afastado do teu meio,
sustentando hibernado os meus sentidos.

Asseguro-te, pois, que estás presente,
com teu corpo desnudo às minhas ânsias,
no universo da minha solidão.

A FOME QUE MATA

A História revela que um povo com fome
é escravo sem nome da elite soberba.
E quando se exalta, a oligarca carcome
as últimas forças da gente olvidada.

A fome derroga direitos banais.
Não há condições de manter liberdades.
Consome a família, adormece ideais,
eis que submisso se entrega o faminto

à vil condição de animal que não pensa.
Crianças na inânia sucumbem aos milhões,
enquanto suplicam no altar da oferenda

as mães que labutam à luz das desditas.
A fome que mata envergonha governos,
levando nações às vilezas morais!

REIVINDICAÇÃO

Transmudam-se os sentidos e outros tempos
acodem ao desespero nas procelas.
A sociedade acorda noutra cela
no universal presídio dos eventos.

Enquanto era sublime o sentimento,
justificando a sã filantropia,
hoje o repúdio à regra marca tento,
fundamentando o bem como utopia.

A dor da massa, então, faz seu protesto,
vindicando ao espírito social
a carta de intenções, um manifesto.

No abandono cinzento e carrascal,
o séqüito infeliz se sente resto
e exige se ab-rogue tanto mal!

ESPERAS

Há muito não sinto o calor do teu corpo.
Partiste em silêncio, deixando saudades,
propondo o retorno aos carinhos sem conta,
aos beijos ardentes... murmúrios, abraços!

Teus zelos, tua voz, os mistérios dos seios
tão túmidos, doces, pulsantes e mágicos!
Recordo o ofegar no quartel do prazer,
encontro noturno, libido sem rédeas!

Ah! Lembro as promessas do amor eternal!
Agora, a estrutura de minha alma balança,
abalo que sofro em virtude da ausência!

Meu sonho está vivo e a memória se inflama!
Assim é o versejo no agora silente,
enquanto haja força voltada às esperas!




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