terça-feira, 14 de agosto de 2012

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Novo livro: A SAGA DE MARIA DÁRIA
(Antonio Kleber Mathias Netto. Editora ZEM, Teresópolis-RJ. 2012)



Indígenas habitavam a Região do Acre, até a década de 1860. Espalhavam-se por inúmeras tribos, divididas em grupos de famílias linguísticas – Aruak, Pano e Katukína. A partir da década de 1870, os seringais começaram a se formar, levando à atividade exploratória da borracha um grande número de seringalistas ambiciosos, que logo instalaram "barracões" nas zonas de maior incidência de seringueiras (Hevea brasiliensis).

O súbito avanço da gente ambicioneira buscando riqueza provocou sérios prejuízos ao meio ambiente. Verdadeira ação predatória. Na medida em que se constituíam núcleos formados pela migração, que era constante, principalmente de nordestinos, os indígenas desapareciam do cenário selvático. A voracidade dos "coronéis de barranco" - donos dos seringais - não permitia a presença de óbices aos seus desígnios comerciais. Área densamente povoada de indígenas, agora se despovoava em nome das imensas propriedades de exploração da borracha.

Essa exploração foi a causa eficiente da forte migração de nordestinos para os interiores da Floresta Amazônica. Ali, eles se confrontavam com a beleza, o mistério e o perigo em que se constituía aquele ambiente mágico e colorido. As pessoas simples que partiam de seus Estados para tentar a vida nos seringais acrianos enfrentavam, desde logo, a arrogância dos "coronéis de barranco", cujo poder de autoridade transformava-os em senhores absolutos de seus empregados, em enormes zonas abandonadas pelo Poder Público. Ao depois, o enfrentamento dava-se com a malária, com as onças, com as cobras, aranhas, escorpiões e com a extrema solidão em que viviam os seringueiros, bastante distanciados da civilização. Sem esquecer as enchentes, que tomavam as florestas por longo período, em enormes extensões, tornando concreto o perigo em que se constituía a presença de animais peçonhentos.

A Saga de Maria Dária leva o leitor aos recônditos mais internados da Amazônia, para conhecer a multiplicidade de circunstâncias que levaram explorados e exploradores a se radicarem naquela natureza bruta, misteriosa e cheia de perigos. Ao mesmo tempo, essa mesma natureza se mostrava pujante aos olhos do nordestino, egresso das secas que esturricavam seu solo, inviabilizando a própria vida na terra de origem.

Passaram a conviver o homem e a natureza pura e bruta. Num intercâmbio de elementos primitivos, tornou-se o acriano um ser diferente.Dotara-se de sensibilidade apurada, reveladora de que sua alma se confundia com a floresta, em cujos interiores virgens abrigavam-se rios enormes e piscosos, igapós, os igarapés, árvores gigantes, frutos, pássaros, peixes, animais, ao lado das lendas, dos mitos, dos fatos e acontecimentos e uma realidade sócio-econômica única no mundo.

Tudo isso representou forte fonte de informação natural para Maria Dária Saldanha, o que a tornou uma mulher determinada, decidida e forte. Sozinha, durante muito tempo, administrou uma colocação, cuidando de três filhos – um faleceu em pleno seringal, antes de completar um ano. Ela era um misto de sonho e luta; superava os obstáculos para concretizar ideais forjados nos fundões da Amazônia. Anos a fio, serviu à população desprotegida dos seringais como parteira, conselheira, amiga, irmã e mãe da gente sofrida que a procurava para receber seu acalanto e sua orientação. Este desempenho humanitário fazia-se feliz, pelo fato de servir à gente necessitada.

Os filhos da floresta, como Maria Daria nominava os rebentos nascidos em suas mãos, viviam e cresciam para construir o futuro do Acre, sempre ao abrigo dos poderes da Grande Floresta, sob as exalações das noites silenciosas e das manhãs tomadas pelo canto dos pássaros. Maria Dária, ao deixar a floresta - seu útero natural -, e partir para a cidade grande – útero social -, levava-se à certeza de que jamais remodelaria sua formação original ao gosto dos novos ambientes. Ela se adaptaria, sim, para a convivência pacífica, har-moniosa e fraternal entre os semelhantes. Assim também conseguiu ver seus filhos crescerem, domados às realidades vigentes na civilização, no entanto, certos de que nunca se submeteriam às exigências de natureza artificial, que os instavam permanentemente a mudanças.

Vale a pena conferir a saga de Maria Daria. É uma oportunidade de conviver ao lado mais humilde da condição humana, onde a vida nos se apresenta quase sempre mais fulgurante.

O AUTOR